O Sistema de Classificação da Função Motora Grossa (GMFCS – Gross Motor Function Classification System) para paralisia cerebral baseia-se no movimento iniciado voluntariamente, enfatizando particularmente o sentar (controle de tronco) e o andar. Ao se definir um Sistema de Classificação em 5 níveis, o primeiro critério foi o de que as distinções na função motora entre os níveis fossem clinicamente significativas. As distinções entre os níveis de função motora são baseadas nas limitações funcionais, na necessidade de tecnologia assistida, incluindo aparelhos auxiliares de locomoção (tais como andarilhos, canadianas e bengalas) e cadeira de rodas, e, em menor grau, na qualidade de movimento. O Nível I inclui crianças com disfunção neuromotora, cujas limitações funcionais são menores do que aquelas normalmente associadas à paralisia cerebral e crianças que têm sido tradicionalmente diagnosticadas como tendo “disfunção cerebral mínima” ou “paralisia cerebral de severidade mínima”. As distinções entre os Níveis I e II não são, portanto, tão evidentes quanto as distinções entre os outros níveis, especialmente para crianças com menos de 2 anos de idade. O foco está em determinar qual o nível que melhor representa as habilidades atuais da criança e as limitações na função motora. Enfatiza-se o desempenho habitual da criança em casa, na escola e nos espaços comunitários. É importante, portanto, classificar o desempenho habitual da criança (não o melhor desempenho), sem incluir julgamentos sobre o prognóstico. Deve-se lembrar que o objetivo é classificar a função motora grossa atual da criança e não julgar a qualidade do movimento ou o potencial de melhoria. As descrições dos 5 níveis são amplas e não pretendem descrever todos os aspectos da função de cada criança. Por exemplo: um bebê com hemiplegia que é incapaz de gatinhar (sobre mãos e joelhos), mas que por outro lado se encaixa na descrição do Nível I, seria classificado no Nível I. A escala é ordinal, sem intenção de que as distâncias entre os níveis sejam consideradas iguais, ou de que as crianças com paralisia cerebral sejam distribuídas igualmente entre os 5 níveis. Um resumo das distinções entre cada par de níveis é fornecido para ajudar a determinar qual nível que mais se aproxima da função motora grossa atual da criança. É reconhecido que a classificação da função motora depende da idade, especialmente durante a fase de bebê e a primeira infância. Para cada nível, portanto, são fornecidas descrições separadas para crianças em diferentes faixas etárias. As habilidades funcionais e limitações para cada intervalo de idade pretendem servir como guias, sem serem abrangentes e sem serem consideradas normas. As crianças com menos de dois anos devem ser consideradas na sua idade corrigida se forem prematuras. Tem sido feito um esforço para enfatizar a função das crianças em vez de suas limitações. Desse modo, como princípio geral, a função motora grossa das crianças que são capazes de realizar as funções descritas em qualquer nível em particular será provavelmente classificada neste nível ou num nível acima. Por outro lado, a função motora grossa das crianças que não conseguem realizar as funções de um nível em particular será provavelmente classificada num nível abaixo.
Sistema de Classificação da Função Motora Grossa para Paralisia Cerebral (GMFCS)
Menores de 2 anos
Nível I Os bebés sentam-se no chão, mantêm-se sentados e deixam esta posição com ambas as mãos livres para manipular objetos. Os bebês gatinham (sobre as mãos e joelhos), puxam-se para levantar e dão passos segurando-se nos móveis. Os bebês andam entre 18 meses e 2 anos de idade sem a necessidade de aparelhos para auxiliar a locomoção.
Nível II Os bebés mantêm-se sentados no chão, mas podem necessitar de ambas as mãos como apoio para manter o equilíbrio. Os bebês rastejam em decubito ventral ou gatinham (sobre mãos e joelhos). Os bebés podem puxar-se para ficar em pé e dar passos segurando-se nos móveis.
Nível III Os bebés mantêm-se sentados no chão quando há apoio na parte inferior do tronco. Os bebês rolam e rastejam para frente em decubito ventral.
Nível IV Os bebés apresentam controlo de cabeça, mas necessitam de apoio de tronco para se sentarem no chão. Os bebés conseguem rolar para a posição de decubito dorsal e podem rolar para a posição de decubito ventral.
Nível V As deficiências físicas restringem o controle voluntário do movimento. Os bebés são incapazes de manter posturas antigravitacionais de cabeça e tronco em decubito ventral e sentados. Os bebês necessitam da assistência do adulto para rolar.
2 a 4 anos
Nível I As crianças sentam-se no chão com ambas as mãos livres para manipular objetos. Os movimentos de sentar e levantar do chão são realizados sem assistência do adulto. As crianças andam sendo a sua forma preferida de locomoção, sem a necessidade de qualquer aparelho auxiliar.
Nível II As crianças sentam-se no chão, mas podem ter dificuldades de equilíbrio quando ambas as mãos estão livres para manipular objetos. Os movimentos de sentar e deixar a posição de sentado são realizados sem assistência do adulto. As crianças puxam-se para ficar em pé numa superfície estável. As crianças gatinham (sobre mãos e joelhos) com padrão alternado, andam de lado segurando-se nos móveis e andam usando aparelhos para auxiliar a marcha como forma preferida de locomoção.
Nível III As crianças mantêm-se sentadas no chão frequentemente na posição de W (sentadas sobre os calcanhares e os joelhos em flexão e rotação interna) e podem necessitar de assistência do adulto para assumir a posição de sentado. As crianças rastejam em decubito ventral ou gatinham (sobre as mãos e joelhos), frequentemente sem movimentos alternados de perna, sendo os seus métodos principais de locomoção. As crianças podem puxar-se para se levantar numa superfície estável e andar de lado por distancias curtas segurando-se nos móveis. As crianças podem andar curtas distâncias nos espaços internos usando aparelhos auxiliares de locomoção, necessitando de assistência do adulto para direcionar e virar o aparelho.
Nível IV As crianças sentam-se no chão quando colocadas, mas são incapazes de manter alinhamento e equilíbrio sem o uso das suas mãos para o apoio. As crianças necessitam frequentemente de equipamentos de adaptação para se sentarem e ficar de pé. A locomoção para curtas distâncias (dentro de uma sala) é alcançada por meio do rolar, rastejar em decubito ventral ou gatinhar (sobre as mãos e joelhos) sem movimento alternado de pernas.
Nível V As deficiências físicas restringem o controle voluntário do movimento e a capacidade de manter posturas antigravitacionais de cabeça e tronco. Todas as áreas de função motora estão limitadas. As limitações funcionais de sentar e ficar em pé não são completamente compensadas por meio do uso de adaptações e de tecnologia auxiliar. Neste nível, as crianças não mostram sinais de locomoção independente e são transportadas. Algumas crianças atingem locomoção própria usando uma cadeira de rodas motorizada com extensas adaptações.
4 a 6 anos
Nível I As crianças sentam-se na cadeira, mantêm-se sentadas e levantam-se sem a necessidade de apoio das mãos. As crianças saem do chão e da cadeira para a posição em pé sem a necessidade de objetos de apoio. As crianças andam nos espaços internos e externos e sobem escadas. Iniciam habilidades de correr e pular.
Nível II As crianças sentam-se na cadeira com ambas as mãos livres para manipular objetos. As crianças saem do chão e da cadeira para a posição em pé, mas frequentemente necessitam de uma superfície estável para se empurrarem e impulsionarem para cima com os membros superiores. As crianças andam nos espaços internos e externos, sem a necessidade de aparelhos auxiliares de locomoção, por uma distância curta numa superfície plana. As crianças sobem escadas segurando-se no corrimão, mas são incapazes de correr ou pular.
Nível III As crianças sentam-se numa cadeira comum, mas podem necessitar de apoio pélvico e de tronco para maximizar a função manual. As crianças sentam-se e levantam-se da cadeira usando uma superfície estável para se empurrarem e impulsionarem para cima com os membros superiores. As crianças andam usando aparelhos auxiliares de locomoção em superfícies planas e sobem escadas com a assistência de um adulto. As crianças são frequentemente transportadas quando percorrem longas distâncias e em espaços externos com terrenos irregulares.
Nível IV As crianças sentam-se numa cadeira, mas precisam de um assento adaptado para controlar o tronco e para maximizar a função manual. As crianças sentam-se e levantam-se da cadeira com a ajuda de um adulto ou de uma superfície estável para se empurrarem ou impulsionarem com os membros superiores. As crianças podem, na melhor das hipóteses, andar por curtas distâncias com um andarilho e com supervisão de um adulto, mas têm dificuldades em virar e manter o equilíbrio em superfícies irregulares. As crianças são transportadas na comunidade. As crianças podem alcançar locomoção própria usando cadeira de rodas motorizada.
Nível V As deficiências físicas restringem o controlo voluntário do movimento e a capacidade em manter posturas antigravitacionais de cabeça e tronco. Todas as áreas da função motora estão limitadas. As limitações funcionais no sentar e em ficar de pé não são completamente compensadas pelo uso de adaptações e tecnologia auxiliar. Neste nível, as crianças não mostram sinais de locomoção independente e são transportadas. Algumas crianças alcançam locomoção própria usando uma cadeira de rodas motorizada com extensas adaptações.
6 a 12 anos
Nível I As crianças andam em espaços internos e externos e sobem escadas sem limitações. As crianças realizam habilidades motoras grossas, incluindo correr e saltar, mas a velocidade, o equilíbrio e a coordenação são reduzidos.
Nível II As crianças andam nos espaços internos e externos e sobem escadas segurando-se no corrimão, mas apresentam limitações ao andar em superfícies irregulares e inclinadas e em espaços lotados ou restritos. As crianças, na melhor das hipóteses, apresentam capacidade mínima para realizar habilidades motoras grossas como correr e saltar.
Nível III As crianças andam em espaços internos e externos sobre superfícies regulares usando aparelhos auxiliares de locomoção. As crianças podem subir escadas segurando-se em corrimões. Dependendo da função dos membros superiores, as crianças manipulam uma cadeira de rodas manualmente. Podem ainda ser transportadas quando percorrem longas distâncias e em espaços exteriores com terrenos irregulares.
Nível IV As crianças podem manter os níveis funcionais alcançados antes dos seis anos de idade ou depender de cadeira de rodas em casa, na escola e na comunidade. As crianças podem alcançar locomoção própria usando cadeira de rodas motorizada.
Nível V As deficiências físicas restringem o controle voluntário do movimento e a capacidade para manter posturas antigravitacionais de cabeça e tronco. Todas as áreas de função motora estão limitadas. As limitações funcionais no sentar e em ficar de pé não são completamente compensadas pelo meio do uso de adaptações e tecnologia auxíliar. Neste nível, as crianças não mostram sinais de locomoção independente e são transportadas. Algumas crianças alcançam locomoção própria usando cadeira de rodas motorizada com extensas adaptações.
Diferenças entre os Níveis I e II
Comparadas com as crianças do Nível I, as crianças do Nível II mostram as seguintes características:
(1) limitações ao realizar transições de movimento ao andar em espaços externos e na comunidade; (2) a necessidade de aparelhos auxiliares de locomoção quando iniciam o andar; (3) baixa qualidade de movimento; e (4) pouca capacidade de realizar habilidades motoras grossas assim como correr e saltar.
Diferenças entre os Níveis II e III
As diferenças são vistas no grau de realização da locomoção funcional. As crianças do Nível III necessitam de aparelhos auxiliares de locomoção e frequentemente de órteses para andar, enquanto as crianças do Nível II não necessitam de aparelhos auxiliares de locomoção depois dos quatro anos de idade.
Diferenças entre os Níveis III e IV
Há diferenças nas capacidades de se sentar e de locomoção, muitas vezes sendo necessário o uso extensivo de tecnologia auxiliar. As crianças do nível III sentam-se sozinhas, têm locomoção independente no chão e andam usando aparelhos auxiliares de locomoção. As crianças do Nível IV sentam-se de forma funcional (geralmente apoiadas), mas a locomoção independente é muito limitada. As crianças do Nível IV geralmente são transportadas ou usam locomoção motorizada.
Distinções entre os Níveis IV e V
As crianças do Nível V não têm independência nem mesmo no controlo de posturas antigravitacionais básicas. A locomoção própria é alcançada somente se a criança puder aprender como operar uma cadeira de rodas motorizada.
Robert Palisano; Peter Rosenbaum; Stephen Walter; Dianne Russell; Ellen Wood;